31 maio, 2007

Passarinho canta na gaiola????





3ª feira me ligou a esposa de um cliente, chorando muito. O marido fora preso e ela não sabia dizer o porquê.
Esse meu cliente é um homem de 48 anos de idade, empresário, trabalhador, pai de um casal de filhos (22 e 18 anos), com residência fixa, e etc. A história: meu cliente comprou um veículo de uma pessoa (um amigo) e passou para outra. Sabia que esse veículo estava com o licenciamento atrasado, e, para deixar tudo certinho, levou um carro para um despachante fazer a vistoria no CIRETRAN e regularizar tudo.
O despachante ligou pra ele e disse que tinha problemas na documentação, que era pro meu cliente encontrá-lo numa certa delegacia de uma cidade encostada na nossa. E lá foi o meu cliente, de boa-fé, ver o que tinha acontecido.
Lá chegando, o despachante e o investigador lhe pediram uma “contribuição” de R$ 1.500,00 para “liberar” o documento, caso contrário, teria que fazer B.O. Meu cliente, indignado, disse que não pagaria nada. O Sr. Delegado pediu que ele esperasse que iriam fazer o B.O., mas tinham dois na frente.
Tomado de ímpeto e P da vida com quem lhe vendera o carro, meu cliente pegou os papéis, a chave do carro, saiu andando tranqüilamente do DP, entrou no carro e foi embora. Deixou o veículo no estacionamento de um grande supermercado da região, e foi pra casa a fim de localizar o amigo que lhe vendera o abacaxi.
10 minutos depois aparecem na casa dele 04 investigadores, armados, gritando, com o conhecido do meu cliente algemado e chorando no camburão, e prenderam o meu cliente (que, assustado, tentou fugir pulando o muro de casa, mas não deu certo).
Bom, lá vai eu pra Delegacia daquela cidade. Delegado simpático, porém extremamente irritado dizendo que meu cliente subtraiu documento público, furtou um veículo e recebeu carro objeto de furto (o motor do carro que ele comprou tinha queixa de furto). Lógico que o doutor estava irritado: como poderia explicar para seu superior que uma pessoa desarmada consegue sair com uma documentação da delegacia, andando calmamente, sem emprego de violência, e ninguém lhe abordou? Incompetência do meu cliente, né?
Cheguei lá 14h, e saí de lá 22:30h com meu cliente preso em flagrante delito como incurso nos artigos 337, 155 e 180 do Código Penal (traduzindo: subtração de documento público, furto e receptação). Por serem crimes gravíssimos, apenados com reclusão, não cabia fiança. A testemunha foi mantida na cela até 20hs (testemunha na cela???? Essa é inovação do Direito Penal). Depois do depoimento, meu cliente (que ficara o tempo todo sem algemas) pediu pra se despedir de esposa e filhos (que estavam comigo), e o colega delegado mandou então que ele fosse algemado.
_Pra quê, doutor? Ele ficou sem algemas até agora!!! Advoguei
_Ah, vai que a família resolve levá-lo pra passear? Além disso, é bom que os filhos vejam quem é o pai que eles têm! Retrucou o aplicador das leis.
Bom, esse meu cliente eu conheço há mais de 05 anos. A família dele freqüenta minha casa e vice-versa. Vê-lo algemado, pedindo desculpas sei lá do que para a esposa e filhos, embrulhou meu estômago. Saí chorando. Será que o delegado achava que a família dele ia tentar capturá-lo com 02 pacotes de bolacha, 02 garrafas de água de 500ml, um livro de oração e um terço??? Acho que sim... Não teve pizza naquele dia.
Saímos de lá e viemos pro escritório pra discutirmos os próximos trâmites. Entramos em contato com um advogado criminalista da região, muito gente boa, mas com um trabalho bem diferente do meu (“passarinho só canta quando está na gaiola)”.
Fizemos os acertos e lá foi a família do meu cliente levantar “os meios” para que meu cliente não fosse encaminhado ao Cadeião e não pegasse o bonde.
Passei o dia de ontem no fórum para ver se conseguia a liberdade provisória. O promotor opinou pela liberdade porque achava muito estranho uma pessoa que representasse risco grave à sociedade (como relatou o delegado) sair livremente da delegacia, andando, ir pra casa, e, mais ainda, levar um carro com o motor roubado para fazer vistoria no CIRETRAN. Para o promotor, estava óbvia a confusão. O juiz concedeu a liberdade provisória e tiramos meu cliente da cadeia já era mais de 20h. A família chorava muito, ele estava acabado, abalado, sujo (na cadeia não tem vaso sanitário, papel higiênico, luz, cobertor), um homem de cabeça baixa, me chamando de “Sim senhora!”, com a vida completamente alterada porque não quis fazer o acerto! A família está gastando mais de R$ 1.500,00 com certeza. Só para ele não pegar o bonde para o cadeião....
Passamos numa igreja e cheguei em casa, 22h00, e fui amamentar minha filha.
Eu estava exausta. Abracei minha filha e fiquei feliz por que, apesar de todas as dificuldades que vivo, não dependo de ver um passarinho preso na gaiola para ganhar meu sustento.
Um pai de família que se atrapalhou porque não quis pagar para liberar um documento, e agora, além de uma terrível experiência de uma noite passada na cadeia, onde o nosso péssimo sistema carcerário induz à escolarização do crime, dos maus tratos, da corrupção, da vantagem pelo tráfico de influência, responde a 03 processos criminais.
Só isso...
Aprendi o que é o bonde.
O que é o passarinho cantar na gaiola.
E o qual o preço da liberdade!
Pelo menos, meu trabalho é honesto, digno, e, modéstia à parte, bem feito.

27 maio, 2007

SOLIDÃO



Do Houaiss


substantivo feminino
1 estado de quem se acha ou se sente desacompanhado ou só; isolamento
Ex.: vive na mais negra s.
2 caráter dos locais ermos, solitários
Ex.: em meio à s. do deserto
3 local despovoado e solitário; retiro
4 vasto espaço ermo, sem população humana
Ex.: s. do mar, da taiga, da floresta etc.
5 sensação ou situação de quem vive afastado do mundo ou isolado em meio a um grupo social
Ex.: quanto mais gente, maior a sua s.

07 maio, 2007




Drão

O amor da gente é como um grão

Uma semente de ilusão

Tem que morrer pra germinar

Plantar n'algum lugar

Ressucitar no chão

Nossa semeadura

Quem poderá fazer

Aquele amor morrer?

Nossa caminhadura

Dura caminhada

Pela estrada escura


Drão

Não pense na separação

Não despedace o coração

O verdadeiro amor é vão

Entende-se infinito

Imenso monolito

Nossa arquitetura

Quem poderá fazer

Aquele amor morrer

Nossa caminha dura

Cama de tatame

Pela vida afora


Drão

Os meninos são todos sãos

Os pecados são todos meus

Deus sabe a minha confissão

Não há o que perdoar

Por isso mesmo é que há

De haver mais compaixão

Quem poderá fazer

Aquele amor morrer

Se o amor é como um grão?

Morre nasce trigo

Vive morre pão

Drão, Drão