16 dezembro, 2012

Tchau! Agora é tudo novo, de novo!



Do que eu vou sentir saudades:
  • Da tranquilidade do condomínio;
  • Dos meus filhos correndo livremente na rua;
  • De passear de bicicleta com os dois pelo Okinawa
  • Do parquinho de areia e da piscina
  • Da bagunça na banheira aos finais de semana
  • Dos churrascos no quintal de casa
  • Do Marquito correndo pelado pela casa
  • Da Jato
  • Da Sofia falando todo dia do Théo, da Manu, da Dora, do Murillo, Da Naty, da Alê, da Maria
  • Da praça do côco
  • Do passeio de pedalinho no Parque Zeca Malavazzi
  • De ir no zoológico no centro da cidade
  • Da ausência de trânsito
  • Das pizzas da Paneteria di Capri
  • Dos almoços no Pesqueiro Cabreúva
  • Do lombo de filhote do Recanto do Tucanaré
  • Da falta de trânsito
  • Das conversas com o Sr. Adilson
  • Das pessoas bacanas que conheci
  • De ver sempre a Vivian, a Raquel e a Cris
  • Da Pamella e do Alê
Do que eu não vou sentir saudade:
  • De acordar todo dia 5:30h da manhã para pegar a Van
  • Do cheiro horrível de ração todos os dias em hora certa
  • Do cheiro de nafta ao sair da refinaria
  • Da poluição de Paulínia
  • Dos carros passando devagar tocando sertanejo universitário bem alto
  • Do meu vizinho jogador centroavante da Ponte Preta que, apesar da filha linda, adora fazer churrasco com pagodão até as 4h da madrugada pouco importando para os demais moradores do condomínio
  • De só comprar frutas e legumes em supermercado porque não tem feira em Paulinia
  • Do povo que dirige colado na traseira do seu carro
  • Do atendimento leeennntoooo
  • Das pessoas sem escrúpulos
  • De pessoas maldosas e interesseiras
  • De ficar longe das crianças para ir a SP
  • Dos pequenos com saudade do pai e dos irmãos
  • Da família junta só aos finais de semana
Do que virá
  • Família perto de novo
  • Reencontrar os vizinhos
  • Sair com as amigas da confraria toda semana para bater papo até altas horas
  • Estar perto de pessoas queridas
  • Estar perto do ativismo
  • Ver meus pais e irmãos ao menos uma vez por semana
  • Os Projetos Ao Cair da tarde da TeiaMulticultural
  • Ir para o clube com as crianças
  • Contação de história, passeios nos parques, piqueniques com os amigos
  • Cultura acessível
  • Passeios no Sesc Pompéia
  • Pão com manteiga na chapa + café com leite nas padarias de SP
  • Café da manhã orgânico no Parque da Água branca
  • Feira toda semana com legumes e frutas fresquinhos
  • Pastel na feira com caldo de cana
  • Passeio no pracinha do central com as crianças
  • Passear na Paulista para ver as luzes de Natal
  • Finalmente conhecer o zoológico de São Paulo
  • Procurar e reencontrar antigas amizades que valem a pena
  • Visitar a Chris e a Lívia e me esbaldar de rir com os vídeos divertidos do youtube
  • Estar com meus filhos, vê-los acordar e colocá-los para dormir todos os dias
  • Estar perto da Adeli
  • Terapia presencial
  • Começar de novo e contar comigo.



31 outubro, 2012

Gente do Trecho.

Foto daqui ó: http://dicas.guiamais.com.br/2012/07/30/viagem-a-um-clique/ 

Há dois anos e um pouquinho comecei uma experiência única e das mais enriquecedoras na minha vida. Fui trabalhar na construção civil em uma obra numa refinaria do interior de São Paulo. Projeto com data de início e término, arrisquei viver e gostei. Lembro-me que logo no início vieram me dizer que eu tinha virado “gente do trecho”... Achei curiosa a expressão, e soube que “trecheiro” é aquela pessoa que se dedica a viver no trecho de obra, de um canto a outro, enquanto durar o projeto, se mudando de mala e cuia para a obra estiver.

Nessa experiência eu conheci gente de todo o tipo, e de muitas índoles, como em todo lugar. Vou falar das pessoas que cativaram o meu coração. Pessoas destemidas, determinadas, que tem fé na força do trabalho para mudar o rumo do país através de dedicação inteira à obra. Pessoas que deixam a sua raiz guardada num lugar para onde vão aos finais de semana de folga de campo e feriados prolongados... Pessoas cuja simplicidade nos dá uma lição a cada dia. Pessoas cujas bagagens cabem em poucas malas, e algumas dela vivem com toda a bagagem no carro porque cada hora está num lugar.

E por viverem assim essas pessoas são solidárias demais. Estabelecem vínculos de confiança rapidamente. Como geralmente estão longe da família, criam com os colegas de trecho a família do dia a dia, e aí se encontram, se apoiam, riem, cozinham juntos, bebem juntos e algumas vezes, choram de saudade juntos também.

São pessoas entregues a esse ambiente, abertos ao que a vida dá de oportunidade. Vivem ali de corpo e alma. E por vezes, encontra nesse ambiente a alma gêmea que esperavam. Nesses poucos dois anos de trecho eu vi 3 casamentos e mais algumas uniões que tenho quase certeza que sairão casório lá na frente.

Pessoas valentes, doces, corajosas, flexíveis, que dão o seu tempo, a sua inteligência e o seu suor ao trabalho, e que enchem os olhos de brilho quando vê o equipamento montado, o pipe rack avançado, a obra tomando forma... Que estufa o peito de orgulho quando a empresa é reconhecida no mercado, e sabe que a sua dedicação com paixão foi o que fez a empresa chegar lá.

O que mais me chamou atenção nessas pessoas foi a fé. Sim, a fé de que sempre há um jeito; a fé na constância da rotina, a fé no projeto, a fé no amor, e a fé na vida.

Eu não sou trecheira. Me falta a flexibilidade necessária. Tenho raízes fortes demais que me puxaram esses dois anos de volta para o meu lugar, estou deixando minha vida de trecheira e voltando para São Paulo, satisfeita e feliz.

Feliz por muitas razões.
  • Feliz por ter aprendido tanta coisa nova, por conhecer um mundo que eu sequer poderia imaginar que existia.
  • Feliz por agregar novos conhecimentos e expertises.
  • Feliz por ter conhecido inimigos que me mostraram tanto de meus defeitos e aos quais agradeço por me ensinarem que posso ser uma pessoa melhor.
  • Feliz por ter partilhado meus dias com pessoas tão bacanas, especiais e excepcionais.
  • Feliz por ganhar amigos e irmãos que eu levarei para a vida toda.
  • Feliz por conhecer de perto aquela “gente que faz”, todo dia, motivado por um sonho, pela crença no resultado do trabalho, que chora quando cai e de forma surpreendente – na mesma rapidez – se levanta e toca em frente.

Hoje olho esse mundo de forma diferente: vejo na estrada, na ponte, no combustível, na infraestrutura desse país muito mais que concreto, aço e equipamentos... vejo o suor e tempo do trabalho de pessoas dedicadas a fazer desse país um lugar melhor.

Agora eu sei de que tipo de gente esse Brasil que prospera é feito! Minha homenagem a vocês, trecheiros, pela sua paixão.

E meu sincero agradecimento por esses dias tão bacanas.

20 setembro, 2012

Dos ciclos que se fecham


De repente, sem se dar conta do dia, da hora, de quando aconteceu, a gente percebe que um ciclo se fechou.
Nem tudo foi falado, mas também muitas coisas não precisavam ser ditas.
Simplesmente o choro diminui.
A angústia cessa.
As dúvidas dão lugar a certezas.
As brumas se dissipam.
E o sol volta a aquecer o rosto.
O calor do dia amanhecendo passa a ser acolhedor.
A nova palavra descoberta do pequeno transforma o dia em especial.
As compreensões e assertividades da menina trazem a fé de volta.
E ainda que a chuva caia, ela vem para frutificar a terra, para aplacar a secura.
Foto por Renata Penna
Assim, de uma hora pra outra, a esperança timidamente aparece bem lá na frente, ainda não perto como se queria, mas o suficiente para ver que sim, ela está ali adiante, ela não esmoreceu.
O corpo ainda cansa e ressente. Porém, a sensação de novos ventos abraçando o corpo traz alívio para a mente, refugo para a alma.
Ainda não se fincou o pé onde o olhar explanou um novo horizonte. Mas agora está mais perto de chegar.
E hoje a vida mais inteira com os aprendizados experimentados, com a intensidade vivida, vai dar espaço para os olhos voltarem a brilhar e o sorriso largo de novo tomar o seu lugar.

17 julho, 2012

Do que não pode ser dito.





Tem coisas que não podem ser ditas.

Às vezes não dizemos por que não se pode mesmo. A proibição impera, a castração impede, e a moral condena. E mesmo que a gente não diga o que não se pode dizer, o fato está ali, só esperando para ser acessado e vivenciado ainda que no silêncio, ainda que escondido na dor da alma, ainda que perdido na sombra e na escuridão. Porque, ainda que não se fale de determinadas coisas, elas não deixam de existir. Ainda que a gente não queira que ela exista. Ainda que a gente acorde dia após dia achando que a rotina vai fazer a sombra dissipar, a mente clarear, e o caminho voltar a ter luz.

Pouco importa que se fale ou não se fale. Pouco importa que a angústia produza um bolo dentro do estômago, o fato é que é preciso encarar a dor. Mesmo que ainda não se possa. Quanto mais tardar, maior a dor fica. E talvez por isso, não se fale dela. Porque escondida dá a impressão que é menor. Porque desconhecida a dor é confortável. Porque é inevitável sentar um dia e chamar a dor para tomar um café. Bater um papo olho no olho. Ver o que ela quer de ti, e o quanto você pode dar de si pra ela. Ainda que não possa ser dito, precisa ser vivido.

Há também aquelas coisas que não dizemos por que temos medo. Um medo tão bem criado, montado com cara, corpo, feição, como um organismo vivo já delimitado e traçado pelo destino, que temos a certeza de que se dissermos vai acontecer o que pensamos. Tem coisas que não dizemos por que temos medo da materialização. Medo de encarar a realidade ou a fantasia. Medo de assumir a verdade ali na sua frente, ou do ridículo que a fantasia escancarada vai produzir. Porque mesmo que a fantasia se mostre ridícula, ficar com ela é mais confortável, porque na fantasia construímos cada pedaço dentro da nossa conformidade, dentro do nosso limite, dentro da nossa possibilidade.

Porque tem coisa mais frustrante do que se deparar com a sua impossibilidade? Ainda que ela não possa ser dita, ainda que ela te cause medo, a constatação da impossibilidade é a realidade do que não se pode construir. É a realidade do final da fantasia. É a realidade de que o caminho escolhido não pode persistir. É a realidade de que o planejamento deu errado. É a realidade que o sonho não se sustentava.

E quando a impossibilidade se mostra tão límpida e cristalina como em frente ao espelho, cessam as construções daquele caminho. É preciso pensar em outros caminhos. É preciso se munir de energia, re-planejar; re-construir; re-fazer (-se). E tudo isso dá trabalho. E a fórmula do trabalho é a força x deslocamento: ou seja, empregue energia e saia do lugar. Deixe de ser estático. Levanta-te e ande...

Mas, para onde andar com o medo assombrando lá fora porque está aqui dentro? Para onde andar com a dor aqui dentro que não vai sair se não se falar com ela, ainda que você mude a direção e coloque força?É, talvez eu tenha que sentar e tomar um café com o que me dói... mesmo que não possa ser dito, embora cause medo... talvez seja essa a solução.

04 abril, 2012

Eu quero ser feliz agora!


Sabe, fiquei tempos esperando o dia em que chegaria a sensação de satisfação.

Esse momento chegou pra mim, uma compreensão dos fundamentos da minha vida. Uma boa sensação de todas as escolhas que eu fiz, do que é importante e que está em ordem.

Meus filhos, os que eu pari e os que o coração trouxe e que me trouxeram a boa oportunidade das possibilidades de uma existência feliz. Da raiz fincada ao chão. De ter perpetuado. De ter construído e de ter deixado frutos. Como a vida me foi generosa, e me deu um lindo papel: mãe do Maurício, da Marina, da Sofia e do Marcos.

O meu companheiro, que me compreende no amor e nas minhas loucuras. Que partilha comigo o dia, a noite, a sombra e a lucidez. O homem que me entende, e que me estende a mão, que me completa, que me ensina e que comigo aprende. Com quem espero caminhar muitos anos da minha vida, mas que, se diferente for, já posso agradecer à vida por ter vivido um amor que deu certo, em todos os seus detalhes, em toda a sua dedicação.

A minha profissão que me inspira. O trabalho que me motiva os dias, e que abriu muitas possibilidades.

A minha família, que está intrínseca em mim, meu pai, minha mãe, minha irmã, meu irmão, meus sobrinhos... de onde trago tantos defeitos, porém mais ainda uma base sólida de caráter, de certeza de saber escolher, da ingenuidade de correr riscos, de acreditar...

Ah, e tem os amigos. Nossa, muitos, muitos deles. Daqueles que eu vejo e falo sempre. Dos que eu não falo há tempos e que eu amo. Das confrades. Da satisfação das amizades que fiz, e das que eu ainda farei na minha vida! Dos que acreditam e dos que duvidam de mim...

É para estar satisfeita, sim!

O resto... são dinâmicas de todos os dias. Dias com dinheiro, outros sem. Dias com saúde, outros nem tanto. Dias mais felizes, outros mais tristes. Dias bons no trabalho, outros ruins. Dias de cair e de levantar. Dias de rir e dias de chorar. Dias de terminar e dias de recomeçar. Dias de se perder e de dias de se encontrar...

E que, com todo o fundamento que encontrei em mim, saberei certamente viver.

Se alguém disser pra você não cantar
Deixar teu sonho ali pr'uma outra hora
Que a segurança exige medo
Que quem tem medo Deus adora

Se alguém disser pra você não dançar
Que nessa festa você tá de fora
Que você volte pro rebanho.
Não acredite, grite, sem demora...

Eu quero ser feliz Agora

Se alguém vier com papo perigoso de dizer que é preciso paciência pra viver.
Que andando ali quieto
Comportado, limitado
Só coitado, você não vai se perder
Que manso imitando uma boiada, você vai boca fechada pro curral sem merecer
Que Deus só manda ajuda a quem se ferra, e quando o guarda-chuva emperra certamente vai chover.
Se joga na primeira ousadia, que tá pra nascer o dia do futuro que te adora.
E bota o microfone na lapela, olha pra vida e diz pra ela...

Eu quero ser feliz agora

Se alguém disser pra você não cantar

Deixar teu sonho ali pr'uma outra hora
Que a segurança exige medo
E que quem tem medo deus adora

Se alguém disser pra você não dançar
E que nessa festa você tá de fora
Que volte pro rebanho.

Não acredite, grite, sem demora...

Eu quero ser feliz Agora

Oswaldo Montenegro


26 novembro, 2011

O espelho, os monstros e o príncipe!




Escrever tem sido na maior parte das vezes a companhia da minha solidão.
A possibilidade de escoltar a angústia que não se aquieta.

E olha, já desisti de querer ser menos intensa. Fazer o quê? Quando se chega próximo aos 38 anos ouvindo por anos a fio que se precisa ser menos exagerada, menos intensa, mais cautelosa e racional e, apesar de todos os cursos de PNL, imersões, religiões, terapias e vivências, a conduta persegue com o mesmo fundamento – ainda que com condutas diversas, talvez o caminho seja aceitar. Aceitar que não se pode querer a vida pela metade quando só o que contenta é a busca do inteiro; aceitar que não é possível ser conformada, quando só o que basta é buscar a consciência; aceitar que não se pode ser superficial, quando só o que basta é perseguir as respostas das entranhas...

E como dividir isso com o qualquer outro de qualquer relação, sem fazer dele um espelho que reflita sua própria projeção?...

Por isso, a companhia é a solidão. Porque a busca interna é solitária. Ainda que a vida boa te brinde com um amor, com as risadas dos filhos maravilhosos, uns bons parceiros de conversa, de mão dada, da cajuína pedida e em falta, mas que conforta a dor, a busca é só! Porque somente aqui dentro é que a ânsia de não bastar persiste, é na solidão da noite com a cabeça encostada no travesseiro é que se sabe a dor de não conseguir pertencer, de não conseguir adaptar, com os pensamentos vagando por lugares inimagináveis infectando o consciente que ainda está desperto, procurando avidamente o porquê de não confiar, o porquê de não conseguir se entregar. São nos pensamentos solitários que as decisões e consequências destas são duramente questionadas, e, mais ainda, severamente confrontadas na busca desenfreada de uma resposta que acolha o coração e que traga a tão falada maturidade, responsabilidade que te acalme e que faça tudo caber no seu devido lugar.

O solitário é quando não cabe. E tem tanta coisa à sua volta que bradar para o mundo que não cabe e pronto, vai representar a cessão aos instintos infantis e imaturos, de ingenuidade, de quem não cresce, e de novo, a necessidade de TER que CABER, TER que RESPONSABILIZAR, TER que AMADURECER.

Mas oras, quem inventou que para crescer e maturar precisa perder a graça? Quem conceituou que se responsabilizar precisa ter em seus sinônimos se conformar, se “acalmar”? É por isso que Peter Pan ficou na Terra do Nunca, e que Saint-Exupery não se tornou pintor!

Nos arroubos infantis que me tiram o sono, acompanhados pela minha solidão na busca das respostas que cheguem às entranhas e que mostrem sempre o mundo novo onde há sempre mais, também há responsabilidade. Sim, porque é preciso se responsabilizar para ter CORAGEM de olhar para si, de se desnudar para além do espelho, e enxergar nas dimensões que estão atrás da lente reta. Porque ali há mais que a imagem conhecida refletida. Ali há desejos, sombras, monstros, os lados que o eclipse comportamental sempre esconde. Mas e daí que há monstros? Eles são meus, e, afinal de contas, nem todos os monstros são maus. Estão aí o James P. Sullivan, o Mike Wazowski para mostrar que o riso dos monstros produzem muito mais energia que as caretas; e também o Edward Cullen, Jacob Black e Bella Swan para mostrar que o monstro também é bonito e que aceitar-se monstro pode nos levar a viver bem.

E que curioso ver que para aceitar-se monstro, primeiro é preciso sentar consigo à só. E, de novo, só!

Conheço uma pessoa muito querida que se sentou só numa sala, e ali esteve consigo, e revisitou as suas dores, os seus monstros tão intensos, que, assim como eu, somente a escrita foi testemunha. E doeu nela, e dói em mim. Mas ela não perdeu a graça... Ela compreendeu, e pode achar seu riso, seus fios, seus contos para que ali não lhe bastasse, mas lhe mostrasse mais, e conhecer mais e saber que há mais para conhecer, bastando-lhe finalmente entender que não haverá fim.

E conheço uma outra pessoa que sabia ali no íntimo que, enquanto não tivesse coragem de olhar que havia um monstro dentro de si, não poderia sentir a sensação livre do vento tocar-lhe o rosto. E essa pessoa, ao invés de um banco na sala, mergulhou em suas entranhas, e buscou no fundo do seu mais sombrio a luz que havia dentro de si. E sim, também teve dores, que são sentidas, vividas, e compensadas pelo fato de saber que ali dentro dela havia mais, não era só o que o espelho do quarto refletia.

E conheço ainda outra pessoa que estava feliz como vivia, mas tinha a nítida sensação de que havia algo dentro de si, para além da vida que ela carregava, que poderia libertá-la. E ela não sentou na sala, tampouco mergulhou em suas entranhas, ela libertou de seu ventre a CORAGEM de conhecer suas sombras internas, parir uma vida nova e uma nova vida dela. E teve dor sim. As físicas e as emocionais que a transformaram, que fizeram de seus monstros as luzes que iluminaram seu novo caminho.

E outra pessoa, sempre às voltas com a leitura, o compreender, mas com a constante sensação de que lhe faltava algo. Essa nem se sentou com seu monstro, porque sempre foi amiga deles. Essa permitiu a convivência de seus monstros com as alegrias das crianças que a vida lhe brindou, transformando seus conceitos, sabendo-se imperfeita e satisfeita com as incertezas de todos os dias que a vida tem, desde que vividas intensamente.

E falo aqui de uma última pessoa, especificamente, à qual eu tiro chapéu. Essa encarou os monstros de sua loucura, fechou-se num quarto com todos eles soltos ao mesmo tempo e os encarou: vamos nessa! “Já que vocês não me largam, fico aqui presa com vocês!!!”. Pois é, depois de brigarem um tanto no quarto, eles perceberam que tinham que caminhar juntos, e a vida dela se tornou mais inteira. Não sem dor, óbvio. Também não sem solidão, mas com a aceitação de que se pode ser intensa, inteira, com risos e choros.

E, assim como as pessoas que citei acima, conheço outras 23 pessoas que, como eu, cada uma a seu modo, se acompanham na solidão de entender que só se chega a anjo quem está com seu monstro, que caminha com ele, que entende a vida na intensidade, na graça de errar e acertar, na graça de não se conformar, de saber que o essencial é invisível aos olhos e que o que torna belo o deserto é que ele esconde um poço em algum lugar.

Por que, nos meus monstros também existe um Principezinho que diz: Mas os olhos são cegos. É preciso ver com o coração...

Imagem daqui

14 novembro, 2011

DA RECIPROCIDADE



Outro dia, frustrada pelo tratamento que recebi de uma pessoa, me queixei com outra de que fulana não era minha amiga. Daí eu ouvi que não se tratava disso, que eu esperava nas minhas relações mais que amizade, eu queria RECIPROCIDADE, mas sem avisar a pessoa disso, e, por isso me frustrava. Puxa, nunca ninguém tinha me falado isso com tanta clareza. Eu já tinha ouvido coisas como “olha, você espera demais das pessoas”; “você faz por alguém e quer que lhe façam o mesmo”, sim, isso tudo é verdade, mas a pessoa com quem eu conversava definiu perfeitamente: Eu espero RECIPROCIDADE nas relações.

E fiquei dias matutando a questão! Fui pesquisar o que é RECIPROCIDADE e encontrei uma definição bem legal aqui ( http://www.infopedia.pt/$reciprocidade ). Vou copiar um trecho que me chamou atenção: “A reciprocidade é a característica do que é recíproco, sendo este tido como aquilo que marca uma troca equivalente entre duas entidades, grupos ou pessoas. O carácter da reciprocidade é o respeito pelo que é mútuo, incluindo a idéia de partilha ou de retribuição. (...) A reciprocidade faz a passagem de algo, de uma pessoa ou grupo, para outra ou outro, sem qualquer carácter de obrigatoriedade, pelo contrário, voluntariamente.”

Pesquisando mais, encontrei um artigo amplo e profundo sobre Dádiva e Reciprocidade, de Eric Saburin aqui http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v23n66/08.pdf em que ele discorre sobre a diferença entre dádiva e reciprocidade. Nesse artigo, o autor esclarece a dádiva – em linhas gerais – como o ato de doação gratuita, já na reciprocidade há um interesse. Um trechinho do artigo que vale a pena ler inteiro: “na antropologia, a reciprocidade foi muitas vezes limitada ao sistema “dádiva/contradádiva”. Depois da contribuição de Mauss, ela foi associada ao conjunto de relações “dar, receber e retribuir”, que corresponde à reciprocidade das dádivas (ou reciprocidade positiva). De fato, o princípio de reciprocidade é mais global e contempla também a reciprocidade negativa (a de vingança) e a reciprocidade simétrica. Neste sentido mais geral, tal conceito pode ser definido como uma relação mútua reversível entre dois sujeitos.”

Bom, o primeiro artigo dizia exatamente o que eu queria ouvir. Que a reciprocidade era a troca equivalente entre as pessoas, sem obrigatoriedade e voluntária. Obviamente, esse entendimento me atendeu porque atendia também as minhas frustrações e angústias. Já o segundo artigo foi um tiro no pé! Ali, o autor descreveu de forma que me convenceu que na reciprocidade existe um interesse e uma obrigatoriedade do dar/receber/retribuir o que, claramente, tira o caráter voluntário da ação! Caramba, então eu espero nas minhas relações uma troca, na mesma medida do que eu dou? Sim... Eu espero. Olhei-me no espelho despida da vergonha dos interesses internos que tenho, e assumi que espero isso sim. Afinal, quem não espera?!

Nas minhas buscas achei uma pessoa que pensa como eu aqui: http://larissyparente.blogspot.com/2011/02/reciprocidade.html Olha só um trechinho do texto bacana dela: “Mas todos nós mais sensatos e realistas queremos sim toda a reciprocidade possível de outras pessoas. Isso pode não encantar à principio, pois é só o que esperamos, mas no dia-a-dia é justamente o que queremos. Desde as primeiras horas do dia, ao levantar e dizermos bom dia, é um bom dia que esperamos como resposta. Cada sorriso dado, é outro que certamente esperemos. Mas isso nem quer dizer que reciprocidade sempre tenha que vir da mesma forma do que se está sentindo ou fazendo... quando estamos em lágrimas, esperamos mesmo um abraço, é toda a reciprocidade esperada em um momento difícil, essa é uma das que mais me encantam e me conquistam; a demonstração de uma verdadeira lealdade. Reciprocidade mesmo, mais observada e mais desejada é a de sentimentos, essa sim é desejada por todos!”

Acredito que a maior parte das pessoas espera reciprocidade nas suas relações, mas não assumem. Pode ser que eu esteja errada. Começo a rever meus conceitos sobre amizade, sobre relações em que se aceita o outro como é, onde não se espera uma troca. Li um texto da minha querida amiga Renata, no Mamíferas (http://www.mamiferas.com/blog/2011/11/a-maternidade-dos-outros.html) em que ela fala da arte das relações em que se aceita as pessoas como elas são, ou gosta ou não gosta, mas não se espera troca! Ai, caramba! Concordo com a Rê, ela é coerente: “E foi então que eu precisei fazer um exercício bastante trabalhoso, mas que tem compensado e me feito aprender bastante: o exercício de aceitar que o outro é isso mesmo – um outro. Que não precisa pensar como eu, para merecer minha amizade, meu carinho, minha consideração. Que para ser amigo, para estar junto, para compartilhar a caminhada, não precisa ser igualzinho, pensar do mesmo jeito para tudo. Precisa ter alguma afinidade, é claro. Mas não precisa fazer tudo igual. Porque amizade, carinho, nada disso é moeda de troca: te dou, se você fizer do jeito que eu quero. Ou a gente gosta, ou a gente não gosta. E se gosta, está do lado, seja como for.”

Então, concordo com a Renata, a amizade não deve ser uma moeda de troca, mas como fazer para não esperar reciprocidade? Não sei... Preciso começar a fazer o exercício trabalhoso de aceitar as pessoas como elas são, e repensar a minha forma de se relacionar com as pessoas...

O fato é que, enquanto não consigo aceitar a maior parte das minhas relações sem esperar a reciprocidade do DAR/RECEBER/RETRIBUIR, me propus um desafio consciente há cerca de duas semanas (digo consciente porque já há algum tempo tenho agido assim sem perceber): tratar as pessoas (sempre que possível) com reciprocidade, ou seja, da mesma forma com que sou tratada. E, nessas duas semanas eu tive algumas surpresas: um tratamento mais carinhoso por parte de algumas pessoas (o que me leva à conclusão de que eu não dava a atenção e carinho devido), e descontentamento de algumas outras.
Engraçado né? Quando eu comecei tratar as pessoas da forma com que me tratam, algumas se irritaram, se afastaram, ficaram nervosas, tristes, frustradas... E outra conclusão: a reciprocidade (como interesse na troca) só vale quando é para o outro! E aí, como fica?

É preciso desarmar o coração e rever os conceitos para que se possa aceitar o outro como ele é, tal como disse a Renata brilhantemente. Por ora, ainda não é possível. Existe a frustração, a tristeza, a raiva e a incompreensão que precisam ser vividas na sua intensidade, para que possam se esgotar, ser compreendidas e esvaziadas. A partir daí, quem sabe eu consigo trocar a reciprocidade por dádiva, que é o dar sem esperar receber, e viver as relações de coração aberto, sabendo que ali está a possibilidade de cada um?

Para concluir, encontrei duas frases de Antoine de Saint-Exupèry no “O Pequeno Príncipe” sobre as quais agora preciso muito pensar para aprender a amar e me relacionar:
“Quando você dá de si mesmo, você recebe mais do que dá.”
“O amor verdadeiro começa lá onde não se espera mais nada em troca.”